A Comissão de Ética Pública da Presidência da República tem poucos poderes. Mas, mesmo limitadíssimos, são suficientes para incomodar o governo do partido do mensalão.
O pouco caso que o partido de Lula, Dilma Rousseff, José Dirceu e sua quadrilha de mensaleiros faz de princípios e valores que a sociedade brasileira tanto preza ficou mais uma vez evidenciado com a atitude da presidente da República perante a Comissão de Ética Pública. Ali, na ótica petista, só pode ter assento quem não incomoda o governo.
No início do mês, Dilma indicou três novos integrantes para compor a comissão, que, esvaziada, há dois meses não se reunia por falta de quórum. Na nomeação, aproveitou para limar do órgão dois integrantes que lhe causaram dissabores: a professora Marília Muricy e o advogado e escritor Fábio Coutinho. Embora pudessem ser reconduzidos para mais três anos no órgão, foram preteridos por Dilma.
O pecado de Marília e Coutinho foi ter recomendado reprimendas, respectivamente, aos ministros Carlos Lupi, então no Trabalho, e Fernando Pimentel, ainda no Desenvolvimento. Dilma não gostou nem um pouco de ver seus auxiliares virarem alvo da comissão, cuja missão é “zelar pelo cumprimento do Código de Conduta da Alta Administração Federal” e “inspirar o respeito no serviço público”.
Insatisfeito com a atitude de Dilma, ontem o presidente da comissão, Sepúlveda Pertence, renunciou ao cargo. Ele esperou dar posse aos novos integrantes da comissão para se afastar. O ex-ministro do Supremo Tribunal Federal não escondeu a irritação com a não recondução de Marília e Coutinho: “Lamento, devo ser sincero, a não recondução dos dois membros que eu havia indicado para a comissão e que a honraram e a dignificaram”, disse.
Marília havia recomendado, em novembro do ano passado, a demissão do então ministro do Trabalho. Carlos Lupi estava enredado numa “enxurrada de denúncias”, como ela descreveu à época, das quais não conseguia se desvencilhar e muito menos explicar. Iam desde convênios suspeitos do ministério beneficiando entidades ligadas ao PDT à acumulação de cargos públicos por Lupi na Câmara dos Deputados, em Brasília, e na Câmara Municipal do Rio.
Naquela altura, Lupi era o sexto ministro de Dilma na corda bamba em razão de uma série de suspeitas de corrupção. A presidente o segurava no cargo havia um mês, quando o relatório de Marília para a Comissão de Ética Pública recomendou-lhe a demissão. Lupi caiu quatro dias depois. (O pedetista, não custa lembrar, é um dos signatários da carta-desespero divulgada na semana passada em defesa do ex-presidente Lula.)
Foi com episódios desta natureza que Dilma construiu seu fantasioso, mas conveniente, figurino de “faxineira ética” de um governo que, apenas em seu primeiro ano de existência, teve seis ministros afastados por envolvimento em corrupção e irregularidades.
Já Fábio Coutinho nem ousou ir tão longe em seus atos na comissão. Coube a ele analisar o caso das polpudas e inexplicáveis consultorias prestadas por Fernando Pimentel à Federação das Indústrias de Minas Gerais, que lhe renderam R$ 2 milhões em dois anos.
Em junho passado, Coutinho propôs a aplicação de advertência ao ministro, por considerar que seu comportamento evidenciou conflito de interesses. A comissão optou por pedir mais explicações a Pimentel e ainda não deliberou a respeito, passado quase um ano do surgimento da denúncia. Recentemente, Coutinho voltou a incomodar ao propôs verificar a legalidade das participações de autoridades em diversos conselhos de estatais.
A decisão de mexer na Comissão de Ética Pública já estava selada desde fevereiro, quando foi aberto processo para investigar Pimentel. Na ocasião, Dilma, contrariada, manifestou a intenção de mexer em cinco dos sete integrantes. “A presidente entende que a comissão está ‘extrapolando’ em suas funções ao tomar decisões contra seus ministros, na avaliação dela apenas com base em denúncias de jornais, sem uma apuração concreta”, informou à época O Estado de S.Paulo.
Até os episódios de Lupi e Pimentel, a comissão tivera atuação ainda mais tímida. Nos casos dos ex-ministros Antonio Palocci, que também enriquecera prestando consultorias, e Erenice Guerra, que transformara a Casa Civil na casa da sogra sob as barbas de Lula e de Dilma, o órgão limitara-se a aplicar-lhes mera censura ética – única cabível, uma vez que já haviam deixado seus cargos.
Com as atitudes agora tomadas por Dilma Rousseff, a gestão petista reduz efetivamente a pó a função do órgão criado pelo governo tucano para zelar pela ética pública na administração federal. Nada mais condizente com um governo cujo partido tem dez importantes figuras sentadas no banco dos réus da mais alta corte de Justiça do país respondendo pelo maior escândalo de corrupção de nossa história. Dúvida não há: ética e PT não têm, mesmo, nada a ver.
Fonte: ITV