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Mudar e reformar a política, sim, mas não para pior!

Por José Aníbal 

Assim que voltar das duas semanas de recesso parlamentar, o Congresso Nacional terá dois meses para mostrar à sociedade se quer buscar uma reaproximação ou se prevalecerão os interesses interna corporis. Há uma inegável crise de representatividade da política e de imagem dos partidos, fruto da combinação de um sistema eleitoral deteriorado e de uma visão distorcida do que é se dedicar à vida pública. Mudemos, ou colocaremos em risco a possibilidade de uma reconstrução racional e consistente do Brasil, debilitado por uma recessão econômica comparável a cenários de guerra ou desastres naturais.

Entre tantas reformas fundamentais para o país se tornar mais próspero, com mais empregos e qualidade de vida às pessoas, está a mudança do funcionamento da política. Não é de hoje. Talvez agora tenhamos chegado ao ápice de um modelo esgotado, corrompido não só pelas relações espúrias entre o público e o privado a que muitos se renderam, mas principalmente pela falta de conexão entre os que exercem mandatos e o mundo real.

Por isso, qualquer proposta de reforma política que lançar um verniz de boas intenções para escamotear o interesse de se agarrar ao próprio mandato estará fadada ao rechaço e à indignação da opinião pública. Será um tiro no pé. Corroborar casuísmos como o distritão, que se finge de sistema de melhor compreensão para o eleitor eleger deputados, mas na verdade tem o mero intuito de dar vantagem aos que já detém mandato parlamentar, é retrocesso dos mais graves.

Enquanto sistema de votação, seria ainda pior do que o atual modelo proporcional de lista aberta. Com todos os problemas que o atual sistema tem, como o efeito Tiririca, o modelo proporcional garante espaço para que a minoria não seja oprimida ou ignorada.

Os graves problemas do modelo proporcional que precisam ser combatidos são as distorções provocadas pelas coligações, o alto custo das campanhas e o distanciamento entre eleitores e eleitos. Melhor do que o tal distritão é adotar o sistema distrital misto. À exceção do nome parecido, são diferentes como a luz e a sombra. No modelo misto, cada eleitor vota duas vezes em seus representantes: em um político de sua região (chamada distrito), com quem terá maior proximidade para discutir problemas e soluções, tanto locais quanto nacionais; e em um partido com o qual tenha mais identificação de ideias e programas. Com isso, o candidato a deputado por um distrito pode fazer uma campanha muito mais barata do que percorrer todo o Estado, e os partidos também reduzem custos ao ter que conquistar voto s pela identificação com o eleitor, e não lançando dezenas de candidatos convocados apenas para acumular votos. Num caso como no outro, os candidatos e os partidos não terão que recorrer aos bilhões de reais de financiamento público.

Para esse sistema funcionar efetivamente, porém, é preciso impedir as coligações de partidos que se juntam apenas para tentar “arrecadar” mais votos, sem quaisquer combinações de ideais ou propostas para o país. Ao mesmo tempo, a exemplo do que acontece em países como a Alemanha, de quem buscamos a inspiração para o modelo distrital misto, no Brasil é imprescindível colocar em prática a cláusula de desempenho, para inibir a atuação de partidos de aluguel, legendas que não têm qualquer tipo de representação social e entram na política como se estivessem abrindo um balcão de negócios espúrios. Esses dois pontos estão na Proposta de Emenda Constitucional (PEC), de iniciativa dos senadores do PSDB Aécio Neves e Ricardo Ferraço, já aprovada no Senado e pronta para votação na Câmara.

Há quem veja na cláusula de desempenho uma restrição à renovação ou à atuação de partidos ideológicos menores. Foi um equívoco o predomínio dessa visão por parte do Supremo, mais de dez anos atrás, que nos levou a essa hiperfragmentação de 35 partidos registrados, 26 com cadeiras na Câmara e dezenas de outros à espera de registro. Nenhum partido será impedido de funcionar e de tentar atrair apoiadores, mas precisará primeiro provar que tem densidade social para daí, sim, usufruir da representação legislativa.

Por fim, mas não menos grave, a hipótese de se criar uma emenda para evitar a prisão de pré-candidatos com oito meses de antecedência não só é casuística, como beira o escárnio. Não bastassem serem transformados em partidos de aluguel, surgiriam os partidos vendedores de salvo-conduto para condenados. Seria pior do que o tiro no pé do distritão – seria o próprio suicídio da política. A restrição à prisão de candidatos vigente, de 15 dias anteriores à data de votação, faz sentido em um país que viveu tantas décadas sob o jugo de regimes autoritários, como os 21 anos da ditadura militar entre 1964 e 1985 ou os 15 anos da Era Vargas (1930-1945).

Estamos no mais longevo período democrático da República, e isso é sinal nítido de que, apesar de desafios ainda a serem superados, somos um país melhor do que em tempos nem tão passados assim. Reformar a política a tempo de promover melhores eleições em 2018 é missão urgente que não pode ser desperdiçada. Mudar e reformar a política, sim, mas não para pior!

José Aníbal é presidente nacional do Instituto Teotônio Vilela e suplente de senador por São Paulo. Foi deputado federal e presidente nacional do PSDB.

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