José Aníbal
‘PT dava mesadas de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson’. Com esta manchete, a Folha de S.Paulo trazia a público no dia seis de junho de 2005 um dos mais graves escândalos de corrupção da história do Brasil: o Mensalão – isto é, a prática sistemática de desviar dinheiro público para comprar apoio de parlamentares.
Sete anos e 50 mil páginas de inquérito depois, os 36 réus do Mensalão serão finalmente julgados pelo Supremo Tribunal Federal. O maior julgamento da história do STF deve começar na primeira semana de maio, e a previsão é de que a sentença saia em até quatro semanas. Para quem não se lembra, vale a pena remontar o caso.
“É mais fácil pagar um deputado do que discutir um projeto de governo”. Assim o ex-deputado Roberto Jefferson explicou a lógica do Mensalão à jornalista Renata Lo Prete, da Folha. Do ponto de vista operacional, desviava-se dinheiro público para corromper parlamentares a partir do superfaturamento de contratos envolvendo empresas estatais.
Jefferson revelou ainda que ministros centrais do primeiro mandato de Lula, como José Dirceu e Antonio Palocci, sabiam do esquema desde 2004. Além de todo o primeiro escalão petista, seus dirigentes e colaboradores, o esquema revelou a ação de personagens obscuros do submundo político brasileiro, como o tesoureiro Delúbio Soares e o publicitário Marcos Valério.
Segundo o procurador-geral, Antonio Fernando Souza, os acusados formaram uma “organização criminosa” que teria desviado R$ 55 milhões, embora investigações posteriores tenham sugerido desvios maiores. Os réus são acusados por formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, peculato e falsidade ideológica.
E o presidente Lula nisso tudo? De acordo com Roberto Jefferson, Lula teria “chorado” ao tomar conhecimento do Mensalão, tal a sua decepção. No entanto, não tardou a aparecer pessoas que asseguravam ter alertado o presidente sobre a prática bem antes de o escândalo vir à tona. Ficou o dito pelo não dito.
Entre os parlamentares envolvidos, apenas três foram cassados, quatro renunciaram para escapar à cassação e à perda dos direitos políticos e 12 foram inocentados – mesmo aqueles que mentiram publicamente sobre as movimentações com o dinheiro sujo. Exceto os banidos e falecidos, os demais estão aí, de volta ao Congresso e ao governo.
O que esperar do julgamento no STF? Por um lado, o clamor social contra a corrupção – e contra o Mensalão especificamente – não perdeu força após sete anos. Basta observar a expectativa popular nas redes sociais, blogs e grupos de discussão na internet. A impunidade seria desastrosa para a nossa democracia, sobretudo em termos de descrença e desmotivação. Do outro lado, há o cinismo dos que apostam nas brechas do sistema.
Primeiro, tentaram protelar o processo, visando à prescrição. Felizmente, um regime de tramitação especial impediu que isso ocorresse. Depois, tentaram rebaixar o Mensalão a “mero” crime eleitoral, como se para tal fim o assalto aos cofres públicos fosse menos grave. Agora dizem que o Mensalão jamais existiu. E seguem apostando na impunidade.
Mas o Mensalão existiu. Basta lembrar que o ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, foi “perdoado” – e foram seus companheiros de PT que o perdoaram – e recebido de volta com churrasco, foguetório e banda de música. Não creio que o STF vá participar desta festa. Ao contrário: o julgamento do Mensalão é uma grande oportunidade para a sociedade brasileira reafirmar a solidez das instituições e o valor dos nossos princípios democráticos.