Debaixo do bombardeio cotidiano de más notícias sobre segurança pública, um sinal de esperança pode passar despercebido: o número de homicídios no Brasil parou de aumentar. Na verdade, diminuiu ligeiramente, de 27 por 100 mil habitantes no começo da década para 24 por 100 mil em 2006, segundo um estudo do Ministério da Saúde.
Num país enorme e heterogêneo, as médias nacionais quase sempre cobrem grandes disparidades regionais. Os homicídios diminuíram em dez estados: Roraima, São Paulo, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Distrito Federal, Rondônia, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Amapá e Tocantins, por ordem decrescente da intensidade da variação. Nos demais aumentaram, em alguns casos dramaticamente.
A maior contribuição para o recuo da violência veio de São Paulo. Pelos dados da Secretaria de Segurança Pública, a soma dos homicídios dolosos e latrocínios no estado chegou a 13.488 em 1999. Desde então o número vem diminuindo continuamente. Em 2004 baixou para 9.134 e em 2007 para 5.420. Uma redução de 60% em oito anos. Resultado parecido com os de Nova York e Bogotá, casos de sucesso internacionalmente consagrados no combate ao crime.
Os estudiosos ainda devem explicações sobre o porquê dessa inflexão. Fatores demográficos, como o envelhecimento da população; econômicos, como a estabilização dos níveis de emprego e renda; sociológicos, como o adensamento das redes de confiança e ajuda mútua entre os moradores das periferias urbanas; políticos, como a universalização do acesso à escola e à rede básica de saúde – cada um e todos eles em conjunto podem influenciar os índices de violência.
Mas por que a queda dos homicídios tem sido tão mais acentuada em São Paulo” Isso é difícil de explicar sem referência específica às políticas de segurança pública.
Para encurtar uma longa história: a atuação da polícia paulista melhorou muito nos últimos dez anos. Cobradas pela opinião pública, estimuladas pelos governos do PSDB, as Polícias Militar e Civil fizeram o fundamental para acertar o passo com a democracia: mudaram o foco de sua missão da defesa do Estado para a do cidadão. Com esse norte, endureceram o combate tanto à violência quanto à corrupção em suas fileiras e investiram fortemente na sua modernização. E puderam fazê-lo com continuidade, o que é decisivo para o êxito de mudanças de fôlego.
Prefeituras e ONGs se engajaram decididamente na prevenção da criminalidade. O Ministério Público e a Justiça fizeram a sua parte. E o estado assumiu o ônus pesado de investir na construção de prisões para colocar os criminosos tirados das ruas. De 1997 a 2007, o número de penitenciárias estaduais mais que triplicou, de 42 para 143. O número de vagas aumentou de 27 mil para 97 mil.
Soluções criam novos problemas. As rebeliões motivadas por superlotação e fomentadas pelo crime organizado dentro dos presídios mostram o tremendo desafio que o crescimento da população carcerária representa para a capacidade tanto de investimento como de gestão do estado.
A situação melhorou, mas está longe de ser satisfatória. Outros tipos de crime, como roubos e furtos, não diminuíram na mesma proporção dos homicídios.
Para o cidadão comum, o importante é que os índices de criminalidade – todos eles – continuem em queda até que se alcance a sensação de segurança que os mais velhos perderam, e os mais moços nunca experimentaram.
Por mais cético que se queira ser, no entanto, é difícil sustentar que o recuo da violência em São Paulo não tem nada a ver com os avanços da polícia, da Justiça e do sistema penitenciário. Mais criminosos presos, menos violência nas ruas. O fato de essa equação elementar funcionar numa parte do Brasil mostra que a paz urbana não é um sonho distante, só alcançável pela melhoria lenta e gradual das condições sociais do país.
Outros estados têm acumulado um repertório considerável de boas práticas em segurança pública. Reconhecer esses esforços, sem tergiversação, é o primeiro passo para aprofundá-los e disseminá-los por todo o Brasil.
O Congresso Nacional respondeu positivamente à aflição da sociedade, aprovando mudanças importantes no código de processo penal e na lei de execuções penais. Só neste ano, cinco desses projetos viraram lei e outros cinco foram aprovados na Câmara.
O Ministério da Justiça poderia contribuir mais, tanto para a disseminação de boas práticas dos estados como para aperfeiçoamentos na legislação, se seu ministro na estivesse tão ocupado de coadjuvante nos reality shows da Polícia Federal.
José Aníbal é líder do PSDB na Câmara dos Deputados