Início Saiu na imprensa O eleito!, por Ricardo Noblat

O eleito!, por Ricardo Noblat

Em parte, ele tinha razão. “A população neste momento está mais voltada para `Avenida Brasil’ e Olimpíadas do que para esse processo escandaloso que tentaram nos imputar”, disse na semana passada Rui Falcão, presidente nacional do PT.

A parte que faltou razão a Rui: “(…) que tentaram nos imputar”.

O mais correto seria: processo que o PT imputou a si mesmo. Porque ninguém forçou o PT a evoluir do Caixa 2 que ajudou a eleger Lula para o mensalão que o ajudaria a governar.

Rui e outros observadores da cena política incorreram também no erro de confundir praça vazia com desinteresse popular pelo julgamento do mensalão.

A Praça dos Três Poderes, em Brasília, para onde convergem o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF), está de fato deserta.

A direção do STF ocupou sua fatia de praça com barreiras que impedem a aproximação de curiosos. E reforçou exageradamente o esquema de segurança. Poucos se dão ao trabalho de ir até lá.

No plenário do STF foram reservados 24 lugares para “cidadãos comuns”. (Sarney? Não! Sarney é um “cidadão incomum”, segundo Lula.)

Metade dos lugares costuma ficar vazia. Ou acaba cedida a jornalistas.

Quem teria paciência e tempo de sobra para acompanhar um julgamento que se estenderá por quase dois meses?

A muito custo os ministros resistem ao sono e enfrentam o tédio. O sono já derrotou alguns. O tédio se impõe como se fosse algo maciço e pesado.

Pesquisa nacional do instituto Datafolha, aplicada na última quinta-feira, ouviu 2.562 pessoas e descobriu que 75% delas estão a par do julgamento no STF.

A maioria (81%) diz que tomou conhecimento do mensalão – embora somente 18% se considerem bem informados a respeito.

Índice tão baixo de conhecimento satisfatório nada tem a ver com alguma espécie de absolvição prévia do PT e, sim, com a falta de gosto da população por assuntos políticos.

Quatro em cada cinco brasileiros (82%) acreditam que o mensalão foi um caso de corrupção que envolveu o uso de dinheiro público para comprar votos no Congresso.

Não foi isso que a acusação aos réus passou os últimos sete anos repetindo?

No mesmo período, com Lula à frente, o PT se valeu de todos os meios para convencer os brasileiros de que houve apenas Caixa 2. Resultado de esforço tão desmedido: só 7% acreditam que houve apenas Caixa 2 de campanha.

Quem diz ser capaz de antecipar o resultado do julgamento está mal informado. É grande, porém, a chance de José Dirceu ser condenado.

Em conversa recente com jornalistas, três ministros do STF, em ocasiões distintas, repetiram mais ou menos o mesmo raciocínio: se não acreditarmos que Dirceu comandou o esquema do mensalão só nos restaria acreditar que o comandante foi Lula.

Na televisão, Lula jurou ter sido apunhalado pelas costas. “Fui traído”, comentou. Jamais apontou os eventuais traidores. E depois passou a se referir ao mensalão como uma farsa.

Ao jornal O Estado de S. Paulo, Dirceu ditou: “Nada fiz sem antes consultar Lula. Nada”.

Roberto Jefferson, o que deflagrou o escândalo do mensalão, dirigiu-se a Lula ao depor no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Aconselhou-o a despachar Dirceu, seu desafeto. Aconselhou, não. Ordenou que o despachasse. Do contrário…

Para que sua cabeça não rolasse, Lula entregou a de Dirceu. Que perdeu a chefia da Casa Civil da presidência da República e em seguida seu mandato de deputado federal, cassado pela Câmara.

Você acha difícil acreditar que Dirceu desconhecesse a existência do mensalão, não é?

Eu também acho.

E Lula? Você acredita que ele desconhecia?

Eu acredito que ele conhecia.

Artigo anteriorDefesa vê caixa 2 como conduta corriqueira’, diz Eliana Calmon
Próximo artigoServidores em greve ganham apoio de centrais sindicais