Artigo José Aníbal
Revista Voto
A estrela do PT encravada nos jardins do Palácio do Alvorada, no início do primeiro mandato do presidente Lula, foi o marco inicial da confusão cotidiana que a república petista costuma fazer entre os limites do público e do privado.
Ao fim do segundo mandato, nos damos conta de que a estrela foi apenas um primeiro passo, como no poema de Maiakoviski primeiro, roubaram uma flor; como todos ficaram calados, pisotearam as flores do jardim; como ainda permaneceu o silêncio, mataram o cão, suprimiram a luz e, por fim, arrancaram-nos a voz da garganta.
A estrela privada foi extirpada do jardim público porque a sociedade gritou. Mas eles não pararam e, na sequencia, a sociedade cansou de gritar, a oposição foi estigmatizada pelo cansaço de repetição, tantas vezes teve de protestar.
A imprensa denuncia os seguidos excessos notórios, mas, ao mesmo tempo, divulga os atos transgressores; os efeitos pretendidos por Lula são alcançados. Hoje, as ações de propaganda de Lula extrapolam em espiral, cada vez mais despudoradas, atropelando os limites aceitos pela Constituição, pelas leis e pela ética tácita dos governantes.
Como presidente, Lula se transformou num animador de auditório que vive num palco a contar parábolas pobres e piadas sofríveis para hipnotizar platéias menos exigentes com a propaganda dos programas que cumpre e dos candidatos que apóia.
Em vez de contribuir para adensar a política, qualificar o debate e elevar os níveis da compreensão popular para as questões centrais da administração pública, faz o contrário: usa seu inegável carisma para manipular artifícios da prestidigitação e iludir as massas.
Desdenha as denúncias sobre seus excessos, coco se, no poder, tudo pudesse e nada devesse.
Leva os temas mais candentes para o nível das conversas de bar, como se as grandes questões nacionais fossem o jogo de futebol da véspera. Descaracterizados, os grandes temas nacionais são sempre reduzidos a uma ótica maniqueísta.
Nessa confusão maliciosa e perversa, o que era importante vira banal , o que era vital, se torna superfície, o que era formal vira piada. Escamoteia seu governo ruim, que não realiza o presente e não pensa o futuro; usa a estrutura pública para fazer campanha escandalosa de sua candidata á sucessão.
O festival de transgressões chegou a um nível de paroxismo. O aparelhamento da máquina pública é uma vergonha republicana, a ocupar todas as boquinhas federais.
Lula não responde às críticas da oposição, simplesmente as desqualifica e não deixa o debate prosperar; diz que a imprensa só deve noticiar -, nunca fiscalizar revelando completa falta de noção sobre os valores que regem as instituições. Usou verbas públicas para montar um acampamento nababesco no sertão nordestino e o fez de palco de um comício amplificado em favor de sua candidata à sucessão.
É essencial que alguém acorde o presidente para seus compromissos institucionais e os limites constitucionais. Trata-se da sobrevivência moral do país, da convivência institucional dos litigantes políticos, das prerrogativas da administração e da ética inerente ao poder: Lula parece desconhecer esses valores morais ou, se os conhece pior ainda -, os ignora solenemente.
Por conta disso, a herança maldita que ele legará a seu sucessor será uma república estiolada nos padrões éticos, um debate público apequenado e desqualificado, um jogo parlamentar viciado e a trágica ideia de que o Brasil é o reino do vale-tudo moral.
José Aníbal é deputado federal por São Paulo e líder do PSDB na Câmara dos Deputados.


