Duas situações ao mesmo tempo tão semelhantes e tão diferentes – e provocando reações distintas. Isto, por si só, já daria o que pensar, porém basta uma análise um pouco mais aprofundada do assunto para constatar a presença de má-fé… Mas vamos por partes.
30 de maio de 2013. O cenário é o município de Sidrolândia, em Mato Grosso do Sul (a 70 km da capital do estado), onde a Justiça Federal emite ordens de desocupação e reintegração de posse numa área invadida por indígenas quinze dias antes, em meio a muitos dos conflitos do tipo em todo o país. A ação provoca a morte de um índio terena de 35 anos – e faz com que Dilma lamente a ocorrência, se dizendo “chocada” com o ocorrido e orientando os auxiliares a agir rápido, de modo a iniciar uma operação de pacificação nas regiões de conflitos. Até mesmo o ministro da Justiça e o advogado-geral da União partem para a articulação de acordos, a fim de suspender possíveis reintegrações de posse.
A área de 17,2 mil hectares reivindicada pelos índios é parte de um processo que se arrasta há 13 anos, tendo sido até mesmo reconhecida pelo Ministério da Justiça como de posse permanente dos índios, com direito a portaria publicada no Diário Oficial da União. A Presidência da República, porém, ainda não fez a homologação da posse, em meio a pedidos de produtores rurais e ameaças de invasões indígenas. O saldo, até agora, foi a morte de um índio de 35 anos – além de outro baleado nas costas. Internado em um hospital de Campo Grande, o indígena está com a bala alojada na 7ª vértebra da coluna cervical, sem que os médicos se arrisquem a prever quais sequelas poderão surgir daí.
Mas voltemos no tempo um pouco mais. 22 de janeiro de 2012, domingo. Aproximadamente seis mil pessoas são retiradas do terreno conhecido como Pinheirinho, em São José dos Campos, no Vale do Paraíba, estado de São Paulo. Ocupado cerca de oito anos antes, o terreno – de mais de um milhão de metros quadrados – pertencia à massa falida de uma empresa do investidor Naji Nahas. A reintegração de posse transcorre sem problemas neste primeiro dia, mesmo com conflitos judiciais – no momento da desocupação, havia uma ordem da Justiça estadual determinando a reintegração e outra, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, suspendendo a ação. O conflito de competência foi parar no Superior Tribunal de Justiça, com a reintegração em andamento, tendo como resultado a decisão do presidente do STJ que declarava como sendo do juízo estadual a competência da situação. Cerca de um mês antes, “ativistas” de movimentos ligados ao PT defendiam a permanência na área e incitavam a formação de milícias para resistir à reintegração. Segundo advogados dos grupos, as pessoas estariam até mesmo estocando gasolina para enfrentar a polícia.
Com os ânimos serenados, a reintegração foi realizada naquele domingo sem nenhum tipo de conflito ou resistência dos moradores. Somente no dia seguinte, quase 24 horas depois da ação, foi que “ativistas” dos tais movimentos posaram para a mídia com escudos e cassetetes improvisados, além dos rostos cobertos por capacetes de motoqueiros ou capuzes. Não bastasse, os manifestantes partiram para o confronto e passaram a culpar o Governo de São Paulo pelo uso de truculência, momento em que também começaram a surgir denúncias de abuso de poder e violações de direitos humanos – supostamente praticados pela Polícia Militar. A ação provocou opiniões contrárias e atos de repúdio por movimentos sociais, entidades da sociedade civil organizada e até mesmo do governo federal – a própria Presidente da República chegou a classificar a operação de “barbárie”, enquanto o ministro da Secretaria-Geral da Presidência afirmava que “o governo paulista praticava terrorismo”.
O que nos traz de volta aos dias de hoje – e à velha política do PT de dois pesos e duas medidas. Por que em uma ação do PSDB, executada da forma correta e sem prejuízos, houve a necessidade de armar uma reviravolta de tal forma que a culpa das supostas – eu disse supostas – agressões fossem debitadas na conta do governo? Tempo para buscar um acordo não faltou, uma vez que foram oito anos de ocupação e tramitação do pedido de reintegração de posse. A prefeitura municipal e o Governo do Estado de São Paulo não poderiam tomar iniciativas por conta própria, já que o caso estava entregue à Justiça e qualquer ação do executivo poderia ser tomada como interferência indevida. Entretanto, para o pessoal do PT, foi mais cômodo não fazer nada e, posteriormente, partir para o ataque. Como não havia o que atacar, fabricaram situações que dessem margem às críticas, numa operação claramente política.
Pois bem. Houve a reintegração de posse do Pinheirinho. Seis mil pessoas foram removidas. Ninguém foi morto – mas, para a presidente, isto foi uma barbárie. E a morte de um índio, como será que ela classifica, então? E o “terrorismo” praticado pelo Governo Paulista, segundo o ministro? Que denominação ele dá ao que ocorreu em Sidrolândia – e que agora precisa até de 110 militares da Força Nacional na região “por tempo indeterminado” para que o conflito seja pacificado?
O problema de ocupações no Brasil é grave, e os governos têm demonstrado intenção de resolve-lo – até mesmo em áreas rurais, como o Itesp busca fazer, mediando conflitos e cada vez implantando mais assentamentos. Mas o que houve no caso Pinheirinho nada tinha a ver com essas questões. Algo que, à medida que o tempo passa, se torna mais claro, especialmente quando comparado com a situação ocorrida no Mato Grosso do Sul. A ponto de o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, dizer com todas as letras que o conflito agrário “não tem solução” – e nem poderia ter! Em vez de dedicar seu tempo a buscar um possível fim para essa situação, ele prefere atacar o Governador do Estado de São Paulo, numa clara demonstração dos verdadeiros interesses do Governo Federal.
O que houve em São José dos Campos, por exemplo, foi uma sabotagem política a uma cidade e a um estado que não se dobrou ao PT. Os politiqueiros a mando do partido que governa o país não se furtaram a utilizar os moradores do Pinheirinho – gente humilde e simples – como massa de manobra para atacar o Governo Alckmin. E tanto eram manobras que as “denúncias” se perderam em meio às contradições dos “manifestantes”, falsos depoimentos, protestos. Sobrou apenas a tristeza de muitas famílias que poderiam ter ido para um lugar melhor, mas foram exploradas ali mesmo pelos supostos ativistas. E enquanto uma reintegração pacífica é “continuada” por manifestantes que não se conformam com a lisura do processo do Governo Paulista, a confusão provocada no Mato Grosso do Sul – com direito à morte de um índio e a tiros nas costas de outro – é tratada como nada demais, apenas um episódio triste.
O que nos dá o que pensar, mais uma vez. O que esperar de um governo que se porta desta maneira?
A continuar o PT no poder, é de se esperar que um dia todos os não-petistas ainda sejam expulsos do Brasil.
*Marco Pilla é membro do PSDB