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“Um Brasil mascarado”, análise do ITV

A morte do cinegrafista Santiago Andrade serve como símbolo de um momento lastimável que o país atravessa. De um lado, o radicalismo de grupos antidemocráticos, de outro a leniência de um governo que não apenas alimenta, como também pratica e propaga, a intolerância, dividindo a nação entre “nós” e “eles”.

O atentado ao cinegrafista – que agonizava desde a quinta-feira passada, quando foi atingido por um rojão disparado por um vândalo black bloc, e ontem teve morte cerebral – merece total condenação e seus responsáveis devem ser exemplarmente punidos. Trata-se de ato de violência explícita, gratuita, deplorável e merecedora de repúdio unânime da sociedade brasileira.

Andrade é a primeira vítima fatal dos protestos que se sucedem no país desde junho do ano passado. Mas sua morte é apenas o 109° caso envolvendo agressões a jornalistas desde então – no total, incluindo profissionais de outros ramos, registra-se 117 ocorrências, de acordo com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji).

Percebe-se que há uma onda de insatisfação se propagando, se manifestando, se avolumando em todo o país. Há manifestações legítimas, democráticas e pacíficas que merecem respeito. Mas há também as que se colocam à margem e em oposição ao Estado democrático de direito. Estas merecem repúdio.

As hordas de vandalismo avançaram ao mesmo tempo em que quem deveria cuidar de reprimi-las foi dando passos para trás, retrocedendo na sua missão de manter a ordem. Neste vácuo, os propagadores da desordem foram tomando espaço, espalhando um clima de insegurança. Com isso, o Brasil que queria manifestar seu desencanto foi acuado.

A morte de Andrade deve detonar uma nova onda negativa em relação ao país. Não se trata mais apenas de um mal-estar econômico. Às vésperas da Copa do Mundo, o Brasil inspira mais temor do que atração naqueles que nos olham de fora. Este é o caminho mais curto para o fracasso: a erosão da reputação de uma nação, o comprometimento de valores universais e a perda da segurança e da confiança.

A imagem do Brasil que hoje é vista aqui e lá fora é a de um Brasil mascarado, de rostos cobertos por panos, de gente pronta para afrontar o status quo. É um Brasil que, cada vez mais, dá medo e difere muito daquele que a propaganda oficial procura vender, orientada por pesquisas de marketing. O Brasil do Carnaval, do futebol e do samba está, neste momento, desaparecido.

Órgãos sérios de imprensa mundial já perceberam o clima que hoje vai tomando conta do Brasil. No sábado passado, o sisudo britânico The Guardian publicou longa reportagem sob o título “Governo brasileiro põe favelas e classe média um contra o outro”. O texto é ilustrado com uma foto de um bando de gente mascarada destruindo catracas. Que país é este?

O texto escancara a falência da ação do Estado para lidar com o clima de insatisfação, ao mesmo tempo em que acusa o governo petista de despender energia na promoção de um Brasil de fantasia. “Enquanto o governo foca na Copa do Mundo para agradar a comunidade internacional, negligencia o povo acima do usual, e as coisas estão prestes a piorar”, analisa o diário inglês.

Como se vê, o mundo todo percebe o que está acontecendo no Brasil. Menos, porém, o pessoal do governo petista. A julgar pelo que tem dito a presidente Dilma Rousseff, só os “pessimistas” e os “caras de pau” não enxergam a maravilha que o PT está construindo nos trópicos. Foi o que ela disse ontem, em cima do palanque armado para comemorar os 34 anos de fundação do PT.

Com o país indignado, Dilma ocupa-se de uma campanha em tempo integral e abdica de exercer as prerrogativas de quem governa uma nação como o Brasil. Ocupa-se em ser candidata e prescinde de ser presidente da República. Está tão preocupada com o que acontece nas ruas que prefere manifestar-se sobre o assunto por redes sociais, ao mesmo tempo em que se delicia com discursos provocando adversários. É muita cara de pau não perceber que o Brasil hoje se apresenta ao mundo como um país mascarado. Infelizmente.

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