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A retomada do poder de fiscalizar

O evidente desgaste da relação entre a presidente Dilma Rousseff e sua base aliada no Congresso Nacional devolve ao Legislativo uma das razões de sua existência: o poder de fiscalização. Uma amostra disso foi dada na última semana, com a aprovação do requerimento, apresentado pelo PSDB, para a criação de uma comissão externa de deputados que irá à Holanda acompanhar a investigação de denúncias relacionadas à Petrobras. Em sessão histórica, além de a aprovação ter-se dado por 267 votos a 28, sendo 15 abstenções, a proposta contou com o apoio de quatro partidos da base aliada: PMDB, PR, PTB e PSC.

Na mesma semana, o governo sofreu outra retumbante derrota na Câmara dos Deputados, com a aprovação de uma avalanche de requerimentos de convite e convocação de ministros para prestarem esclarecimentos sobre as mais diversas denúncias de irregularidades, dentre as quais podemos destacar a acusação de suposto recebimento de propina contra funcionários da Petrobras (motivo da criação da comissão externa da Câmara), com a convocação da presidente da estatal petrolífera; os problemas de corrupção identificados em contratos de ministérios com ONGs, bem como os problemas gerados com o regime de contratação dos médicos cubanos pelo governo brasileiro.

Com ampla maioria na Casa – já que possui mais de 400 deputados na base aliada, contra menos de 100 da oposição -, o Executivo navegou em águas calmas por muito tempo. Mas, como eu já havia escrito em artigo publicado no ano passado, a falta de traquejo de Dilma com o Legislativo, em geral, e até com sua própria base de apoio, está fazendo com que vários parlamentares reavaliem sua posição, felizmente, em favor de um Congresso mais independente e que cumpra o seu papel fiscalizador.

Como líder da bancada do PSDB em 2013, pude testemunhar os erros de condução política e de relacionamento com o Congresso, por parte do Executivo comandado por Dilma. Posso citar aqui a crise na condução da regulamentação da atividade médica, o chamado Ato Médico; a queda de braço com promotores que culminou na derrubada da famigerada PEC 37, que limitava o poder de investigação do Ministério Público; a condução atabalhoada na discussão do Código Florestal, que opôs produtores rurais e ambientalistas, entre outros casos polêmicos.

O Congresso começou a dar mostras de que a situação poderia mudar após os protestos que tomaram as ruas do país, em junho do ano passado. Em setembro, pela primeira vez nesses 11 anos que estou na Câmara, a discussão dos vetos presidenciais foi retomada pelos parlamentares, num gesto emblemático de que a relação com o Executivo seria diferente. Antes, o Congresso limitava-se a acatar tais vetos, e ponto final. Agora, são votados e podem ser mantidos ou derrubados.

A crise com o Legislativo acabou culminando com a criação do chamado “blocão”, grupo que se declara independente, comandado pelo aliado PMDB, que ajudou a oposição a formar maioria para aprovar os últimos pedidos de apuração e de esclarecimentos ao governo. Assim, os parlamentares retomam a condição de agentes fiscalizadores do Executivo, como manda a Constituição. É o mínimo que a população espera de seus representantes. A oposição, mesmo sabendo que esse “blocão” pode ter uma vida curta, continuará aproveitando esse momento ímpar para debater e corrigir os erros desse governo, que não são poucos. Quanto ao futuro, o que podemos garantir é que, com ou sem esse bloco “independente”, continuaremos atentos para que a Câmara dos Deputados, cada vez mais, cumpra seu papel de legislar e de fiscalizar com a eficiência que o Brasil espera.

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