Na última terça-feira (16), o prefeito Fernando Haddad (PT), publicou decreto que autoriza a circulação de skate, patins, patinete, triciclo, quadriciclo, bicicletas elétricas e cadeira de rodas nas ciclofaixas e ciclovias da cidade.
Reparem que a lista até chegar a seu último item, refere-se apenas ao que conhecemos por “meios de transporte”. Com a decisão da prefeitura, contudo, o cadeirante paulistano passa a ser considerado um veículo, não mais um pedestre.
Conceitualmente, tal caracterização é um retrocesso, já que ao definir espaços distintos para circular diferenciou-se também a pessoa na cadeira de rodas da pessoa que caminha com as próprias pernas. Na prática, o decreto é uma ameaça para segurança de muita gente.
Como bem lembrado pelo jornalista desta Folha e parceiro de causa, Jairo Marques, “cadeiras de rodas não têm retrovisor e bicicletas não possuem freios ABS”.
Segundo o presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), Ailton Brasiliense Pires, outros meios podem conviver com as bicicletas. Mas, devido ao risco de acidentes, deve haver um limite de velocidade baixo para as vias (algo próximo de 10 km/h), o que não existe hoje em nenhuma das faixas pintadas de vermelho no asfalto da maior cidade do país.
Já é sabido por qualquer gestor municipal que, em todo o Brasil, muitos cadeirantes são obrigados a circular pela rua porque não contam com calçada acessível. Mas esse nunca foi e nem será o meio mais seguro para quem tem uma deficiência ou mobilidade reduzida.
Não é o que ocorre nas cidades do mundo que são símbolos de mobilidade urbana. Em Amsterdã, por exemplo, onde a bicicleta é um meio de transporte muito utilizado, cadeirantes circulam pelas ótimas calçadas construídas pelo Poder Público. Não pelas ciclovias.
São Paulo, por mais problemas que tenha com o passeio público, ainda é uma das cidades brasileiras referências em acessibilidade.
Um decreto deste cunho caminha contra tudo o que vem sendo construído pelo direito de ir e vir com liberdade e segurança.
A decisão mais segura e adequada para um pedestre é um passeio público que o dignifique, e não que o diferencie por utilizar uma cadeira de rodas. Esta, diga-se de passagem, é uma extensão do corpo do cadeirante. E não um meio de transporte que pode se abrir mão.
Infelizmente, a capital paulista vem investindo muito pouco no passeio público. De acordo com dados da execução orçamentária, só para 2014 a prefeitura tem previsto para a reforma de calçada quase R$ 52 milhões. Mas, até o momento usou apenas R$ 300 mil –o equivalente a irrisórios 5,8% do total.
Se o objetivo do prefeito Fernando Haddad era investir no bom convívio entre as tribos e os meios de locomoção, ele deveria rever sua decisão e investir na reforma de nossas calçadas. Segundo o IBGE, 30% das viagens diárias realizadas no país são feitas a pé , por conta do alto custo do transporte público.
A calçada é o equipamento mais universal de uma cidade. Quando acessível, permite que andantes, cadeirantes, cegos, idosos, crianças e toda a diversidade humana coexista pacificamente e tenha a possibilidade de chegar ao outro com respeito e sem barreiras.