José Aníbal
A falta de uma política nacional voltada à indústria da cana-de-açúcar tem inquietado o mercado e prejudicado o consumidor. Com a demanda energética aquecida, oscilações no mercado de petróleo e mudanças climáticas, nada justifica a negligência do país com opções limpas, renováveis e competitivas como o etanol e a bioeletricidade de bagaço e palha de cana.
No caso do etanol, a interferência do governo federal na formação do preço da gasolina derruba a competitividade do biocombustível.
Uma manobra tributária permite a Petrobras não repassar o aumento das refinarias para a bomba, criando um mercado artificial e imune às variações internacionais, além de represar pressões inflacionárias.
Como resultado, há sobreutilização do combustível fóssil e subutilização dos renováveis. Esta irracionalidade tem efeitos em cascata.
Com o esgotamento da capacidade de refino, passamos a importar mais 300% de gasolina para suprir a demanda. Ao mesmo tempo, há capacidade ociosa nas usinas de produção de etanol e de biodiesel.
Exceto em São Paulo, onde o ICMS do etanol é metade do recolhido noutros estados, o biocombustível não é capaz de competir com esta gasolina ofertada com tal artificialidade.
Mesmo com as justificativas macroeconômicas, não é razoável privilegiar um energético sujo e não renovável em detrimento do etanol, que emite 90% menos gases de efeito estufa e cuja cadeia produtiva comporta evidentes vantagens competitivas.
Menos compreensível é a falta de empenho para o aproveitamento do potencial em bioeletricidade de bagaço e palha de cana. A demanda mundial por energia deve crescer 40% até 2035.
O Brasil produz 600 milhões de toneladas de cana. Cada tonelada rende 250 quilos de bagaço. Por sua vez, uma tonelada de bagaço gera 300 KWh de eletricidade.
Hoje geramos 1,8 mil MW médios com bagaço de cana. Só em São Paulo há bagaço o bastante para gerar 15 mil MW até 2020, o equivalente a três usinas Belo Monte.
Buscando incentivar essa energia verde, o governador Geraldo Alckmin isentou de ICMS o maquinário voltado à modernização das plantas de geração. Porém, as barreiras do atual modelo de leilões, somadas à falta de conexões entre usinas e rede elétrica, fazem com que não exportemos mais de 1 mil MW médios.
O setor daria um salto de competitividade se o governo federal ajustasse as condições concorrenciais, por exemplo, realizando leilões regionais por fonte.
Com eficiência e impacto ambiental nulo, a bioeletricidade de bagaço e palha de cana poderia ser um componente importante na expansão do suprimento de energia. Sobretudo, se a perspectiva de expansão do setor, em 70%, for realizada nos próximos 10 anos.
O mundo todo gostaria de ter alternativas competitivas, eficientes e sustentáveis como a cadeia energética da cana. Porém, falta uma política de Estado específica para esta indústria.
Sem ela, esta grande vantagem comparativa do Brasil ganha cara de oportunidade perdida. Falta ao governo federal um pouco mais de ousadia, visão de futuro e racionalidade. São Paulo tem feito sua parte.