A escolha de Roberto Azevêdo para comandar a Organização Mundial de Comércio (OMC) é motivo de orgulho e merece ser comemorada pelos brasileiros. A vitória é o reconhecimento da bem sucedida trajetória de um diplomata de alta qualificação. Não pode, porém, ser confundida com um aval à política externa praticada pelo governo do Brasil nos últimos anos.
Azevêdo venceu a disputa pelo mais alto cargo de um órgão multilateral de comércio do mundo com apoio maciço de nações em desenvolvimento e de países mais pobres. Seu oponente tinha suporte explícito dos Estados Unidos e da maioria da União Europeia. Nem por isso o diplomata brasileiro pautará sua atuação por uma visão cindida de mundo; já deixou claro que buscará a conciliação.
Embora as manifestações oficiais tenham sido corretamente comedidas, nos bastidores o governo brasileiro estaria classificando a vitória de Azevêdo como “reconhecimento à política externa de aproximação com o hemisfério Sul”, segundo a Folha de S.Paulo. Pragmaticamente, este alinhamento abaixo do Equador pode até ter rendido mais apoio à escolha do diplomata para a OMC, mas objetivamente não tem trazido bons frutos comerciais ao país.
O pior que pode acontecer agora é a gestão petista apregoar que ter conseguido levar Azevêdo ao comando do principal órgão multilateral de comércio do mundo significa que foi acertado o caminho trilhado pelo Brasil nestes últimos dez anos em matéria de política externa e de comércio exterior. Não foi.
A tônica da diplomacia petista tem sido o direcionamento dos nossos esforços externos no rumo dos países em desenvolvimento, na chamada política Sul-Sul. Nesta linha, mercados mais robustos foram praticamente desdenhados nesta última década. A consequência não tardou: o comércio exterior do Brasil definhou em mercados com o dos EUA e o europeu – e agora até mesmo na China e na Argentina.
Nestes últimos dez anos, passamos de superavitários para deficitários nas relações comerciais com norte-americanos e europeus. A despeito de chineses e argentinos continuarem aumentando suas importações, a fatia abastecida por produtos brasileiros nestes mercados está caindo. Até abril, nosso comércio exterior como um todo está no vermelho, com déficit de mais de US$ 5,7 bilhões, o maior desde 1995 para este período do ano.
Nossa fatia no comércio mundial, que já era irrisória, ficou ainda menor no ano passado: caiu a 1,3%. Isto é praticamente o mesmo patamar de 30 anos atrás. Neste quesito, entre as principais economias do globo o Brasil foi um dos que teve pior desempenho em 2012, devido à queda das nossas exportações, como mostrou O Estado de S.Paulo em abril.
O Brasil mantém-se como uma economia ainda relativamente pouco aberta. A soma de nossas importações e exportações equivale a 20% do PIB. É bem menos do que em países com perfis econômicos similares ao nosso: o comércio internacional representa 43% do PIB do México, 47% do da China e 93% do da Coreia.
Num mundo em que, nos últimos anos foram lançados mais de 450 acordos de comércio, nossa diplomacia limitou-se a fechar negociações apenas com Palestina, Egito, Jordânia, Israel, Índia e África do Sul – as duas últimas de escopo bem limitado. Vicejam ainda as preferências ideológicas e os alinhamentos políticos, com parcos resultados econômicos.
Em setembro, Azevêdo assumirá o cargo tendo como missão destravar as negociações multilaterais de comércio no mundo. Ou seja, sua agenda como diretor-geral da OMC e timoneiro desta difícil negociação é claramente liberalizante, bem diferente, portanto, da postura protecionista que o governo brasileiro tem adotado nos últimos anos.
Neste sentido, é sintomático que o governo Dilma tenha hesitado muito antes de submeter o nome de Azevêdo à disputa pelo comando da OMC. A candidatura dele foi a última a ser inscrita, no último dia de prazo, em 28 de dezembro do ano passado, quando os oito demais postulantes já estavam na briga, como relata hoje o Valor Econômico.
O sucesso de Roberto Azevêdo na nova função depende de ele fazer à frente da OMC tudo o que a gestão petista não vem fazendo. Mais êxito ele obterá quanto mais comércio houver. É esta a lição que o governo brasileiro poderia tirar da escolha do nosso brilhante diplomata para a direção do órgão sediado em Genebra.