Roberto Freire *
Assim que assumiu a Presidência, o governo Lula construiu o mito da “herança maldita”, forma como tratava o governo que lhe antecedera, buscando criar uma falsa dicotomia, que seria o motivo de todas as dificuldades que o governo do PT enfrentava.
Foi esse mito urdido de forma reiterada que possibilitou que ninguém percebesse o fato cristalino, o engodo magistral, a total ausência de qualquer projeto de governo da administração petista.
Por “herança maldita”, denominava o atual governo um conjunto de realizações que a administração FHC tinha implementado, visando uma maior racionalização do processo administrativo do Estado e a modernização de nosso sistema produtivo.
Assim, o legado da Lei de Responsabilidade Fiscal, que obrigava a união, estados e municípios a serem cautelosos com suas despesas, cumprindo uma restrita política fiscal, base da estabilidade da moeda tão arduamente conquistada nos governos Itamar Franco e FHC, sempre foi duramente criticada pelo PT.
Isso também aconteceu com o processo de estabelecimento de agências reguladoras, que modernizou as relações entre o setor produtivo, Estado e sociedade.
Esse processo possibilitou a implementação de vultosos investimentos nas áreas de telefonia, energia e estabeleceu os pressupostos de um projeto de desenvolvimento de longo prazo, que tinha na superação de nossos históricos gargalos da infraestrutura e em um consistente e multifacetado processo de inclusão social os elementos centrais de enfrentamento de nossas históricas desigualdades sociais.
Passados quase oito anos de governo do PT, ainda se menciona essa “herança maldita”, para não evidenciar a inoperância e incapacidade de gestão do atual governo, no enfrentamento de nossas mais sérias questões, seja de infraestrutura (como o monumental “apagão” do sistema elétrico que praticamente paralisou o país por 24 horas, no ano passado, como os reiterados “apagões” aéreos, como temos assistido nos últimos dias), seja nos serviços prestados à população no que diz respeito à segurança, à saúde e educação.
Próximo da conclusão do mandato, podemos perguntar: que herança deixará o atual governo a seu sucessor”
Na política externa, por exemplo, um consumado desastre, com nossa diplomacia associando-nos com as mais violentas e sanguinárias ditaduras, como a do Irã, ou com governos autoritários populistas, como o da Venezuela, elemento de tensão permanente na região.
Internamente, um governo que fez do assalto à estrutura do Estado, sobretudo das estatais, um método eficiente de cooptação de “aliados”, e da demagogia e da irresponsabilidade fiscal uma forma de adulação das camadas mais carentes de nossa sociedade, ao mesmo tempo em que contribuía para um violento processo de concentração de renda, com crescentes transferências de recursos para as elites do país.
O horizonte que se delineia para o país em 2011 e 2012 é dos mais inquietantes. Talvez agora saibamos o que Lula e o governo do PT queriam dizer com o termo herança maldita.
Roberto Freire é presidente do PPS e candidato a deputado federal por São Paulo