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A ausência de participação dos jovens

Em sua obra ‘Futuro de classe e causalidade do provável’, Pierre Bourdieu introduz o conceito do ‘habitus’; então concebido como um sistema individual, socialmente constituído de disposições estruturadas no social e estruturantes nas mentes; adquirido por experiências práticas socialmente determinadas – numa classe social – constantemente orientadas para a vivência cotidiana.

O que esta definição sociológica difícil de entender está propondo é que o ser humano se vê limitado por características reais do seu cotidiano e por características subjetivas que ele acredita estarem dadas dentro de sua realidade. Seria o caso de um aluno da rede pública que acredita não ter competência suficiente para estudar numa Universidade Pública ou um garoto da mesma idade estudante de escola particular que deseja estudar numa Universidade Norte Americana.

Desta forma o ‘habitus’ se liga a outro conceito chamado de ‘causalidade do provável’: o fato de existirem chances negativas ou positivas de algo ocorrer predispõe os indivíduos a agirem de modo que suas chances presumidas possam ocorrer.

Isso significa que, no exemplo dado, o estudante de escola pública não consegue estudar suficientemente bem porque acredita – mesmo que inconscientemente – que não tem chances, então guia suas ações de forma ao resultado negativo ser atingido. O estudante de escola particular, num meio social encarado como mais adequado ao perfil de um estudante do exterior, guia suas ações a um resultado positivo e consegue o resultado esperado.

Esse exemplo, devo frisar, não representa todo o universo de estudantes, todos sabemos que há exemplos que fogem desta situação, ele é meramente ilustrativo e pode ser aplicado a outras situações.

Utilizo os conceitos elaborados por Bourdieu porque acredito que eles possam ser aprofundados de forma a discutirmos a ausência de participação política da juventude do país. O ‘habitus’ da juventude brasileira não parece estar voltado à participação política, primeiramente porque isto não lhes foi ensinado nem pelas escolas frequentadas (fossem estas públicas ou privadas), nem pelos pais (a não ser os ligados a um tipo de militância partidária ou de movimentos sociais) e nem pelos colegas da mesma idade que compartilham as mesmas inseguranças e desafios.

A ausência de participação política parece intrínseca a maioria dos indivíduos, como enunciado por Benjamin Constant a liberdade da modernidade é justamente a possibilidade de não interferência política; diferente dos antigos, gregos principalmente, os quais a verdadeira liberdade era poder tomar conta dos assuntos estatais e se ter a plena consciência da decisão tomada por todos os cidadãos em sua própria virtude.

Uma juventude carente de recursos econômicos, materiais e culturais parece jogar para último plano a participação política. Não há espaço dentro de sua realidade, dentro de seu ‘habitus’, a exploração de um conceito tão difícil e tão contraditório que é a política. Sim, porque a política exige tempo, disposição, estômago e uma conduta própria, ajustada aos indivíduos que a ela pertencem. Nem mesmo a práxis – conceito também de Bourdieu que argumenta que a vestimenta, postura e vocabulário do indivíduo também são indicadores sociais de sua origem e vivência – esconde o indivíduo em sua participação. Em sua inadequação.

Consequentemente, para que este jovem participe, é necessário que se descortine em seu ‘habitus’ uma estrutura estruturante (uma estrutura colocada de fora, quero dizer) que o leve à participação.

Cabe às juventudes partidárias a instrução sobre a participação. Cabe às juventudes partidárias estruturar um debate em que a realidade destes jovens se adeque, que possua significância e que possa ajudar os partidos políticos a compreender e reinventar sua participação voltada à esta realidade.

Qualquer juventude política sem debate e aproximação de bases falha em sua proposta. Não se deve esperar a participação voluntária dos jovens. A ‘causalidade do provável’ destes é o isolamento, e não a participação. É a integração com realidades mais próximas dele: o culto frequentado pelos pais, a escola de inglês necessária a seus estudos e alternativas culturais e de lazer aos fins de semana.

Uma realidade paralela e diferenciada não se descortina por si só na sua presença. É necessário influenciar o cotidiano destes jovens de forma que nos ouçam e desejem participar melhorando suas próprias vidas e sua sociedade. É necessário de nossa parte influenciar ‘habitus’, ‘causalidade’ e ‘práxis’ tanto destes indivíduos… quanto nossas.

Irina Cezar é membro da Juventude do PSDB-SP

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