A greve de professores das instituições federais de ensino completa dois meses nesta terça-feira (17). A paralisação, que ao longo deste tempo atingiu 92 instituições entre universidades e institutos tecnológicos, mostrou que, além da reivindicação por reestruturação do plano de carreira e o aumento do salário, os docentes aproveitaram o momento para denunciar a falta de estrutura e o sucateamento das universidades.
De acordo com o diretor do Andes (Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior) e professor da Universidade Federal de Campina Grande (PB) Josevaldo Cunha, todas as universidades vinculadas ao sindicato relataram problemas relacionados à falta de infraestrutura nos campi.
— A baixa qualidade dos ambientes acadêmicos é um problema em todo o País. Nas federais, há obras inacabadas, muitas paradas por questões técnicas ou por entraves na licitação. Também recebemos relatos de falta de mobiliário, de auditórios.
Segundo Cunha, a maior parte desses problemas foi agravada com o Reuni (Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais), que, desde 2003, aumentou de 43 para 59 o número de universidades mantidas pelo governo federal.
— Além da necessidade de ampliar os espaços, também precisamos aumentar o número de docentes. Só que isso não foi feito na medida da demanda, o que piorou as condições de trabalho e de ensino. Atualmente, são mais de 4.000 professores com contratos temporários. Isso precisa ser revisto para que a universidade cresça com qualidade.
De acordo com Daniel Iliescu, presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), a questão do sucateamento também preocupa os alunos das federais.
— Já apresentamos um relatório com as pautas específicas de 53 das 59 universidades ao ministro da Educação [Aloizio Mercadante]. Nele, relatamos a falta de moradia estudantil, bibliotecas atualizadas, laboratórios, entre outros problemas. Esperamos que o MEC [Ministério da Educação] nos ajude a solucionar essa questão para além da pauta da greve.
Nesta terça-feira, representantes da UNE e da Sesu (Secretaria de Educação Superior), órgão vinculado ao MEC, devem se reunir para discutir a solicitação dos estudantes.
— A expectativa é garantir a permanência do aluno na universidade. Os jovens, principalmente os de baixa renda, precisam ter acesso ao ensino superior, mas também precisam de condições adequadas para estudar.
Falta de professores e de espaço
Uma das instituições que enfrenta o sucateamento é a UFRR (Universidade Federal de Roraima). Segundo Jaci Guilherme Vieira, docente da instituição e representante do comando de greve da SESDUF-RR (Seção Sindical dos Docentes da UFRR), o principal problema é a falta de professores.
— Em arquitetura e psicologia, por exemplo, dos dez professores, apenas quatro são efetivos, e o problema se repete em outros cursos.
A falta de estrutura física para comportar o aumento do número de alunos também preocupa, diz Vieira.
— Novos prédios e salas foram construídos, porém, ainda falta mobiliário e adequação do espaço. O ideal seria concluir as obras antes de fazer a expansão.
A reitoria da UFRR foi procurada pelo R7, mas não se manifestou até o fechamento da reportagem.
Em São Paulo, além da falta de professores, a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) também enfrenta a falta de espaço em seus campi.
Segundo Virgínia Junqueira, presidente da Adunifesp (Associação dos Docentes da Unifesp), o principal problema é no campus da cidade de Guarulhos, onde quase 3.000 alunos precisaram se mudar para um prédio emprestado pela prefeitura até que um novo espaço fosse construído.
— A Unifesp expandiu de dois campi para seis. Isso aumentou o número de alunos, mas os espaços não estavam adequados. No campus de Santos, por exemplo, as obras foram interrompidas por problemas na estrutura do prédio. Agora, mesmo com a obra concluída, ele não comporta os alunos do curso de educação física, que precisam de piscina e de um espaço amplo para os treinamentos.
Segundo Virgínia, os estudantes fazem as atividades no clube Saldanha da Gama, que fica próximo ao campus.
— Para suprir essa demanda, seria necessário fazer um terceiro prédio.
Novos problemas
Também em São Paulo, a UFABC (Universidade Federal do ABC) relata problemas de infraestrutura. Ao contrário das veteranas, a instituição, que tem apenas sete anos de existência, não passa por um sucateamento, mas sim por entraves no processo de construção.
De acordo com Armando Caputi, presidente da ADUFABC (Associação dos Docentes da UFABC), o principal problema é na demora e construção de novos espaços, que não acompanharam o crescimento rápido da instituição.
— Ainda que esteja funcionando, a universidade tem problemas estruturais, como falta de laboratórios, prédios e moradias estudantis, que não atendem à demanda e não estão completamente prontos para receber os alunos.
Segundo o reitor da UFABC, Helio Waldman, esses problemas fazem parte da expansão.
— As atividades acadêmicas começaram há cinco anos e, desde então, tivemos uma evolução extraordinária. No começo, não tínhamos nenhum laboratório e agora eles estão sendo equipados, assim como novos prédios estão sendo construídos. Tudo faz parte de um processo.
Outro lado
Em nota, o MEC afirmou que “as universidades receberam R$ 8,4 bilhões para a expansão e reestruturação desde 2003. Do total de 3.930 obras, 2.493 já estão concluídas (63,4%) e 970 (24,7%) estão em execução. As obras paralisadas ou com contratos cancelados somam 186 (4,7%), as demais 281 obras estão em processo de licitação”.
Ainda segundo a nota, “em 26 de junho deste ano a presidenta Dilma Rousseff sancionou a Lei nº 12.677/2012. que cria 77.178 cargos efetivos, cargos de direção e funções gratificadas para as instituições federais de ensino. Ao todo são 19.569 cargos de professor de terceiro grau e 24.306 de professor de ensino básico, técnico e tecnológico. Outros 27.714 destinam-se a técnicos administrativos”.
A reitoria da Unifesp também foi procurada pela reportagem, mas não havia comentado as afirmações do sindicato até o fechamento desta reportagem.