Para quem acompanha a trajetória do índice oficial de inflação, o IPCA, facilmente percebe uma considerável permissibilidade do Governo Federal, principalmente no ano passado, com seu descolamento do centro da meta, estipulado em 4,5% ao ano. Dados recentes indicam que nos dois primeiros meses de 2011 o índice, anualizado, já superou 6%, com perspectivas de atingir 6,5%, para desacelerar apenas no último trimestre.
Pouco sensata é a defesa do indicador se situar dentro da banda de inflação definida, de +/- 2pp, vez que para um centro de 4,5%, 2 pontos representem uma margem exagerada, desqualificando-a com indicador confiável.
Tais perspectivas inflacionárias são bastante elevadas para os padrões internacionais, especialmente por contarmos com uma das maiores taxas de juros reais do planeta. Vejamos a preocupação chinesa com inflação próxima a 5%, numa economia que cresce a média de 10% ao ano, com juros bem menores que os brasileiros.
O panorama internacional, com toda essa sucessão de conflitos nos arredores do Oriente Médio, tem se agravado sobremaneira com preocupações em torno da cotação do barril de petróleo, atingido níveis próximos aos recordes pré-crise 2008/2009. Tamanha é a tensão que já vêm sendo revistas as disposições das economias centrais, principalmente EUA e Europa, em retomar o aperto monetário, ou aumento da taxa de juros, visto o efeito em cascata que o aumento da gasolina confere ao risco inflacionário numa economia.
E, nesse contexto, aqui no Brasil, no último dia 10 de março, a ata do COPOM (Conselho de Política Monetária) nos revelou o cenário base do Banco Central em trabalhar com projeções de plena estabilidade de preços no ano para gasolina e alguns derivados de petróleo, mesmo com toda a volatilidade de preços para o principal combustível concorrente, o etanol. Contudo, se mesmo com a eliminação no Brasil de um dos principais riscos à inflação no mundo todo, a evolução doméstica dos preços já é tão acentuada, imaginemos então o tamanho do desarranjo dos fatores de produção do país para gerar toda essa instabilidade. É grave, sem dúvida!
Por outro lado, é natural que ninguém condene a oportunidade de um país de oferecer estabilidade de preços a um bem de elevado consumo, a gasolina. Preocupa-me, de fato, a maneira de sustentação desse cenário, que NÃO se baseia na assunção de responsabilidades pela Fazenda, através de adequada dotação orçamentária.
Notamos um famigerado e muito particular mecanismo de manipulação de mercado pela Petrobras, que, embora majoritariamente controlada pelo Estado, é uma empresa de capital aberto, listada na Bolsa de Valores e que, a despeito das boas práticas corporativas de atenção ao acionista minoritário, acaba sendo usada pelo Governo para fins políticos de contornar responsabilidades da Fazenda Nacional, sob o argumento de desprezar a volatilidade internacional na precificação de seus produtos.
Em minha opinião, tal desordem administrativa acaba por infinitamente oferecer margem de manobras questionáveis, como a famosa contabilidade criativa, e fere princípios fiscais teoricamente inatacáveis.