Andrea Matarazzo
Parcela importante da população brasileira mora em locais profundamente carentes de qualquer qualidade urbana. Favelas e comunidades de periferia abrigam trabalhadores sem renda suficiente para acessar o mercado formal de habitação. Nessas regiões, muitas vezes de ocupação irregular antiga, o poder público não investiu como nos bairros regularizados – e nem poderia – para criar arruamento, iluminação, saneamento. As casas são precárias e a ausência de infraestrutura urbana torna a vida muito difícil. Vive-se sob o risco de inundações, deslizamentos de terra. Lama e esgoto na época das chuvas, buracos e poeira na seca.
Algumas dessas áreas, especialmente favelas, encontram-se em locais centrais, que passaram a ser valorizados sob o ponto de vista imobiliário. Com frequência, há quem proponha a retirada da população para outros locais. O tema é complexo, porque contrapõe o direito básico à habitação ao direito de propriedade, com o poder público no centro, administrando a difícil tarefa de mediar dois interesses contrários, mas ambos legítimos.
Está claro que, sempre que se consiga a regularização das áreas, deve-se garantir a permanência de todos os que não estejam em locais de risco. Afinal, depois de tanto tempo, essas localidades consolidam alta densidade demográfica. Quando possível, o ideal é que a localidade seja regularizada a urbanizada, sem que se percam de vista os direitos legais do proprietário. O mesmo se dá nas vastas periferias das metrópoles.
Dotar esse locais de um padrão urbanístico digno já é programa conhecido e vem sendo realizado com sucesso em várias partes, a exemplo das maiores favelas de São Paulo, Paraisópolis e Heliópolis. Urbanizá-las foi decisão política fundamental, que se impôs pela densidade e pela antiguidade das ocupações.
Os investimentos que o poder público deve fazer em localidades com estas características não são pequenos. As obras não são fáceis e as dificuldades técnicas, institucionais, operacionais e jurídicas são um belo desafio. Não se trata de fazer projetos e empreendimentos urbanísticos à forma tradicional, uma vez que cada solução para arruamento, instalação de canalizações de água e de esgoto, drenagem das águas pluviais, iluminação das ruas, e tudo o mais, precisar ser adaptado às circunstancias já existentes, minimizando a retirada de população. São obras bastante artesanais e que demandam conhecimento e vínculo estreito com as comunidades envolvidas.
Moradores que estejam em locais de risco, sujeitos a deslizamentos ou a inundações, por vezes devem ser reassentados em outros locais para eliminar o risco de acidentes, se possível na mesma comunidade. Também é preciso identificar espaço, mesmo em ocupações tão densas, para a infraestrutura de serviços públicos, como serviços de saúde e escolas. Em Paraisópolis e Heliópolis, belas instalações para ensino fundamental e técnico foram implantadas pelo Governo do Estado de São Paulo. São projetos de sucesso, concebidos com critérios sociais, urbanísticos e ambientais.