O segundo dia de julgamento do mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF) foi retomado às 14h25 desta sexta-feira (3) com a acusação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, prevista para durar até cinco horas.
Na quinta-feira, o julgamento começou com uma questão de ordem que acabou levando ao atraso do cronograma — inicialmente, a apresentação de Gurgel estava prevista para ontem. A questão de ordem para que o processo fosse desmembrado foi pedida pelo advogado Márcio Thomaz Bastos –que defende José Roberto Salgado, empresário do Banco Rural. Os advogados Marcelo Leonardo e Sandra Maria Pires, que defendem, respectivamente, Marcos Valério e José Genoino, reiteraram o pedido, que acabou negado por nove votos a dois.
A questão gerou bate-boca entre os ministros Joaquim Barbosa, relator do processo, e Lewandowski, o revisor da matéria. Enquanto Barbosa votou pelo indeferimento do pedido, alegando que a Corte já tratou da questão anteriormente e que é “irresponsável voltar a discutir essa questão”, Lewandowski concordou com os advogados e votou pelo desmembramento do processo. Os votos dos ministros sobre a questão de ordem duraram cerca de três horas.
“Escandaloso esquema de corrupção”
Durante as cinco horas que terá para apresentar as suas acusações sobre o caso do mensalão aos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) nesta sexta-feira (3), o procurador-geral da República deve bater na tecla de que o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu seria o líder do esquema. Na sua tese, o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares e o então presidente do partido, José Genoino, eram subordinados a Dirceu, o que é negado pela defesa.
Gurgel, que é o chefe do Ministério Público Federal, será o acusador dos 38 réus do processo do mensalão. Eles são acusados de participar de um esquema de pagamento de propina a parlamentares em troca de apoio ao governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O procurador-geral irá ler uma síntese das acusações contra todos os envolvidos. Na semana passada, ele já havia enviado aos 11 ministros do STF um memorial com as principais provas contra os réus, incluindo depoimentos e laudos periciais.
No documento, ao qual a reportagem da “Folha de S.Paulo” teve acesso, Gurgel afirma que o caso foi “o mais atrevido e escandaloso esquema de corrupção e de desvio de dinheiro público flagrado no Brasil”. Gurgel diz ainda que o mensalão representou “um sistema de enorme movimentação financeira à margem da legalidade, com o objetivo espúrio de comprar os votos de parlamentares tidos como especialmente relevantes pelos líderes criminosos”.
Impedimento de Toffoli
Além da acusação, existiria a possibilidade de o procurador-geral pedir o afastamento do ministro DiasToffoli do julgamento, mas ontem Gurgel já se manifestou contra a ação. “Essa é uma questão do ministro. Da minha parte, a oportunidade que eu teria que suscitar a questão seria hoje [ontem] e, como disse, optei por não fazê-lo.”
Nomeado por Luiz Inácio Lula da Silva, Toffoli foi advogado do PT e também advogado-geral da União durante o governo de Lula, o que poderia prejudicar seu julgamento do caso. Amigos do ministro e até sua namorada, a advogada Roberta Rangel –que chegou a defender um dos réus–, o aconselharam a não votar no processo.
Polêmica na CPI
De perfil discreto, Gurgel teve a sua atuação questionada por não ter acionado o STF após receber as conclusões da Operação Vegas, da Polícia Federal, em 2009, que investigava os negócios do Carlinhos Cachoeira e o envolvimento no esquema do então senador Demóstenes Torres (sem partido, ex-DEM-GO).
A investigação antecedeu a Operação Monte Carlo, que, em fevereiro deste ano, resultou na prisão de Cachoeira, acusado de explorar jogos ilegais e de traficar influência.
Em resposta às críticas, Gurgel alegou que a primeira operação ainda não tinha elementos suficientes para incriminar os envolvidos. A decisão de suspender a Operação Vegas foi da subprocuradora-geral da República, Cláudia Sampaio, mulher de Gurgel, que informou a sua decisão ao marido.
A história veio à tona no depoimento de um delegado da Polícia Federal à CPI do Cachoeira em maio deste ano. Parlamentares passaram a defender a convocação de Gurgel e da mulher dele. Eles acabaram não prestando depoimento, mas Gurgel enviou suas respostas à CPI por escrito.
No auge da tensão entre integrantes da CPI e a Procuradoria Geral, Gurgel chegou a atribuir as críticas ao “medo do julgamento do mensalão”.