Por Aloysio Nunes
O Brasil participará, a partir desta segunda (27), da Conferência das Nações Unidas para negociar um tratado com o objetivo de proibir as armas nucleares. Fiel ao princípio constitucional que determina o uso da energia nuclear para fins exclusivamente pacíficos, lutamos por um mundo livre do armamento mais letal já concebido.
A negociação de um tratado de banimento é o resultado de três conferências sobre os impactos humanitários dessas armas. Realizadas entre 2012 e 2014, hoje conhecidas como a “Iniciativa Humanitária”, elas concluíram que a detonação de uma bomba nuclear teria efeitos impensáveis sobre as normas básicas do direito internacional humanitário. Isso sem falar no impacto catastrófico sobre a vida humana e o meio ambiente.
Na última das conferências, em 2014, mais de 120 países subscreveram a “Promessa Humanitária” de empreender ações para banir essas armas do planeta. A “Iniciativa Humanitária” decorre do próprio Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP), cujo preâmbulo determina o emprego de “todos os esforços para prevenir o perigo” da guerra nuclear e para “preservar a segurança dos povos”.
Os Estados nuclearmente armados, infelizmente, não se associaram à “Promessa Humanitária”, preferindo uma “abordagem progressiva” para reduzir os perigos e, em última análise, alcançar o desarmamento nuclear.
É verdade que, desde o auge da Guerra Fria, o número total de ogivas nucleares diminuiu significativamente. Mas será que estamos mais perto de um mundo livre desses armamentos?
Se tomarmos como base os resultados da “abordagem progressiva”, a resposta é não: depois de mais de 50 anos da entrada em vigor do TNP, nove países ainda detêm mais de 15 mil armas nucleares, arsenal mais do que suficiente para destruir o planeta.
A maioria dos Estados nuclearmente armados assumiu compromissos com o desarmamento nuclear, mas não demonstra o mesmo entusiasmo com ações concretas.
Essa postura não é coerente com as preocupações da grande maioria dos países, que deseja o avanço urgente do desarmamento nuclear com base em imperativos éticos, de segurança, econômicos e ambientais.
Diferentemente do que pregam os defensores da “abordagem progressiva”, o tratado de banimento de armas nucleares não atentará contra o Tratado de Não Proliferação Nuclear. Antes o reforçará, ao instar todos os Estados a empreenderem medidas efetivas com vistas à cessação da corrida armamentista e ao desarmamento nuclear.
A comunidade internacional já baniu as outras armas de destruição em massa, as químicas e as biológicas, não havendo razão para não proibir, igualmente, a única capaz de aniquilar a vida na Terra.
É passada a hora de tomar medidas corajosas para corrigir uma perigosa lacuna jurídica na construção de um mundo mais seguro.
Para a diplomacia brasileira, a defesa do desarmamento nuclear, mais do que uma opção estratégica, constitui um imperativo moral e um dever constitucional.
Participaremos da conferência com espírito construtivo, com a consciência de que a adoção de padrões de conduta mais elevados no âmbito multilateral ainda é a melhor alternativa para promover soluções eficazes e legítimas para os desafios globais.
Convidamos todos os países a se juntarem a nós e aos demais patrocinadores da iniciativa e a participarem de maneira construtiva desse exercício histórico.
ALOYSIO NUNES FERREIRA é ministro das Relações Exteriores. Foi senador (PSDB-SP) e ministro da Justiça (governo FHC)