O Supremo Tribunal Federal, enfim, decidiu arquivar a investigação sobre o envolvimento de parlamentares de partidos de oposição ao governo federal no caso Siemens.
Após 15 meses de diligências, concluiu-se que são insustentáveis os indícios apontados no documento apócrifo arranjado pelo ex-deputado estadual Simão Pedro (PT-SP), atualmente secretário municipal de Serviços de São Paulo.
Quem atenta contra as reputações? Os que não gozam de nenhuma. É assim desde que os homens passaram a se reunir em praças para discutir questões públicas. O difamador é um personagem tão velho quanto a política. Aliás, o lamaçal da campanha do ano passado e a degradação atual deixam claro como o governo Dilma Rousseff é terreno fértil para esses tipos.
O que houve não foi maledicência. Foi um crime. Como nos anos dourados do ditador Josef Stálin, na União Soviética, o aparato estatal foi utilizado para forjar suspeitas contra a integridade de adversários. É a vileza em seu estado mais imundo. As forças democráticas do nosso país devem estar mobilizadas para identificar e rejeitar novas ameaças dessa máquina difamadora, que quer aprofundar seu enraizamento no poder a qualquer custo.
O documento surgiu com o então deputado estadual Simão Pedro, chegou ao Ministério da Justiça via Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e foi parar nas mãos do diretor-geral da Polícia Federal, que mandou investigar.
O ex-diretor da divisão de transportes da Siemens Everton Rheinheimer negou que fosse o autor da denúncia. O ex-deputado Simão Pedro negou que tenha produzido o documento. O Cade negou que o recebeu ou que o repassou ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Apenas este se calou.
Depois de três dias fugindo da imprensa, José Eduardo Cardozo assumiu que encaminhou o dossiê apócrifo à Polícia Federal. Como não existe protocolo de entrada do documento na PF, ficou provado que o ministro repassou-o adiante, digamos assim, “por fora”.
Na ocasião, o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, disse à TV Globo que não havia ninguém com “foro privilegiado (parlamentares) sendo investigado ou sequer indícios de seus envolvimentos”.
O juiz federal Marcelo Cavali considerou que “os elementos obtidos pela autoridade policial […] são fragilíssimos em relação às autoridades”. A procuradora Karen Kahn, do Ministério Público Federal, manifestou-se contra o envio do inquérito ao Supremo, mas, por insistência de um delegado da PF de São Paulo, o juiz o enviou ao STF.
O Supremo, por sua vez, mandou para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que pediu mais informações: o que havia recebido era insuficiente.
O delator –que reiterou nunca ter falado comigo– fala novamente. A partir daí, só calúnia. Diz que foi orientado a “tratar com José Aníbal, deputado estadual”. Nunca fui deputado estadual! O procurador-geral, no entanto, sem se dar ao trabalho de ir ao Google, manifesta-se pela instauração da investigação.
Na ocasião publiquei nota dizendo que a manifestação de Janot era “temerária e extremamente perigosa para a democracia”.
O caso não pode se encerrar com o arquivamento da denúncia. Seu desdobramento natural é o desbaratar da operação política por trás das fraudes documental e processual.
Quem é o autor da falsificação que ocupou a mais alta corte do país, inutilmente, por 430 dias? Quem a “esquentou” dentro do governo, transformando o apócrifo em prova documental? Qual deles enganou a imprensa e a opinião pública deliberadamente? É isso o que a Justiça deve esclarecer a partir de agora.
Usar o Estado para fabricar crimes políticos atenta contra a democracia. É a forma de criminalizar o direito de divergir, de combater e de se posicionar. Movo ação contra Simão Pedro, José Eduardo Cardozo e Everton Rheinheimer por denunciação caluniosa. A infâmia e o infame vão aparecer.
É Dilma quem, ironicamente, corre sérios riscos biográficos. Os fatos atentam contra a reputação de seu governo. São os fatos, e não documentos forjados. É melancólico ver o Ministério da Justiça, por onde passaram Diogo Antônio Feijó, Tancredo Neves, Paulo Brossard e José Gregori, tornar-se um buraco quente onde se “esquentam” dossiês.
Imagino calafrios institucionais quando ouço que o ministro José Eduardo Cardozo já esteve cotado para assumir a vaga de Joaquim Barbosa no STF. Seria o sinal derradeiro de que Dilma mandou o juízo às favas e abraçou-se de vez com a mentira e com o fracasso.