Uma vez, lá pelos conturbados idos do governo Collor, um político alagoano cravou no adversário o apelido de “pistoleiro de almas”.
Nenhum dos dois era criatura de se abrigar em casa nem flor de bom perfume. Daí, talvez, a escolha pelo acusador da designação que se aplicava de modo específico ao acusado por sua habilidade no manejo da arma do constrangimento moral para atingir seus objetivos.
Aquilo nunca me saiu da cabeça. A expressão de quando em vez escapole do escaninho onde foi guardada, por se adequar a comportamentos e situações recorrentes no cenário político.
Volta forte nesses tempos de substituição de ideias por insultos, de exercício explícito da ilação melíflua, da transformação da opinião em crime passível de rigorosa punição, da intolerância ante o contraditório, da distorção das palavras e ausência de compreensão dos raciocínios, do anonimato a serviço da agressividade no qual as redes sociais na internet encontram o ambiente ideal para replicação.
O desacato coator é o último recurso do covarde cheio de razão e carente de argumentação.
Quando tudo o mais falha, recorre à intimidação. De várias maneiras. Anos atrás, ainda no governo Fernando Henrique, um ministro agastado com declarações de uma deputada atribuiu as críticas a transtornos da menopausa.
Mais ou menos na mesma época, um sindicalista, hoje deputado, chamou a chefe da recém-criada Corregedoria (agora Controladoria) Geral da União de “feia e mal amada” por causa de uma auditoria que detectara fraudes dos repasses de verbas do Ministério do Trabalho para a central sindical dirigida pelo dito cavalheiro.
Não tendo como responder, ambos optaram por aliar humilhação e prepotência para tentar encabular.
Na ocasião não existiam as “redes” que hoje repercutem, ampliam e até conferem eficácia aos ataques. Vejamos os tucanos acusados desde o início do primeiro governo Lula de legar ao País uma “herança maldita”.
Não havia substância nem lógica no carimbo, mas foi aceito por puro constrangimento. Em boa medida devido ao fato de que a ascensão de um “operário” ao poder transformava qualquer reação crítica em manifestação de preconceito.
É a dinâmica malsã do maniqueísmo. De certa maneira contribuiu muito para o sucesso do então candidato Fernando Collor de Mello, a despeito de já ter sido um desastre conhecido como prefeito de Maceió e governador de Alagoas.
Como, na condição de candidato à Presidência, se concentrava nos ataques ao impopularíssimo governo Sarney – “batedor de carteira da História”, dizia ao modo da “pistolagem” referida pelo conterrâneo citado no início – críticas a ele eram computadas como apoio a Sarney e, por receio, evitadas.
Aos dias atuais: O PT sabe que o procurador-geral da República tem sustentação legal para não ir à CPMI, bem como não desconhece a impossibilidade de impor o “controle social da mídia”.
A insistência não visa ao objetivo declarado, por inviável. Utiliza-se do meio: coagir moral, social e politicamente o enorme contingente que se deixa conduzir pela coleira da intimidação.
Vasos comunicantes. Em qualquer processo de investigação, notadamente os de natureza política como comissões parlamentares de inquérito, a chance de surgir uma surpresa, um fato novo e definitivo está na eventualidade da contradição entre acusados e/ou depoentes.
Na CPMI mais famosa do País, descontado o aparecimento de um (a) personagem inesperado (motorista, secretária, ex-mulher etc.) não haverá confronto de versões.
Três grandes advogados, Márcio Thomaz Bastos, Antônio Carlos de Almeida Castro e José Luis Oliveira Lima, estão interligados na defesa dos grandes alvos: Demóstenes Torres, Carlos Augusto Ramos e Fernando Cavendish.
Atuam também no processo do mensalão e convergem no que tange a posições políticas. Mas isso é até secundário.
Essencial em relação à CPMI é que haverá consonância, nunca dissonância.