Início Artigos Inflação: Todo cuidado é pouco

Inflação: Todo cuidado é pouco

Ricardo Buso*           

Depois de alguns bons anos, falar de inflação no Brasil, infelizmente, vem sendo recorrente, tal qual o já notório desarranjo produtivo em que o país foi sendo gradativamente inserido, que alertou o “senhor dragão”.

            Na missão de estímulo ao crescimento econômico e contenção do surto inflacionário, o Banco Central Brasileiro vem suando a camisa para tentar trazer o índice de preços para dentro da meta estabelecida para 2011, de 4,5%, com dois pontos percentuais para mais ou para menos de banda de flutuação. Convenhamos que esses dois pontos adicionais são pura margem de manobra, vez que acrescentam quase 50% à verdadeira meta, desvio inaceitável até para os mais tolerantes.

            Agora, após um considerável período de medidas para segurar o crescimento econômico e, por conseqüência, a inflação, parte da mídia e a própria equipe econômica do governo vêm comemorando mais um recuo mensal do IPCA, que agora encerrou maio em 0,47% ao mês, quando o período imediatamente anterior foi de 0,77%, o que, sem sombra de dúvida, é um bom dado a divulgar. Cabe apenas observar que no acumulado de 12 meses o índice já supera até o teto da banda de flutuação para o ano.

            De qualquer forma, esse bom indicador reflete o chamado “índice cheio”, ou um apanhado geral (algo como uma média), mas quando abrimos suas componentes, verificamos, por exemplo, um recuo sazonal do álcool combustível de quase 15% no mês, que reflete nesse “índice cheio”. Logo, se o combustível recuou tanto assim, e nos próximos meses o fenômeno não se repetirá, pode significar que a pressão das demais componentes esteja menos domesticada que o esperado.

            E a infelicidade em mensurar a inflação apenas pelo “índice cheio” está no fato de que, por exemplo, uma significativa parcela da população, menos favorecida, não tem veículo (movido a álcool) para se beneficiar desse recuo de preços, sendo, portanto, a sua inflação “particular” muito maior do que o indicador oficial do governo aponta e pelo qual muitos itens são corrigidos, inclusive salários.

            Ainda decompondo o índice médio, percebemos uma insistência do ataque inflacionário pela componente “serviços”, que em 12 meses já acumula a incrível alta de 8,54%. No mês de maio essa parcela do IPCA representou 0,59%, o quarto maior valor para a série histórica de 12 medições mensais.

            Reitero que qualquer recrudescimento mensal no índice de inflação é sempre digno de comemoração, mas também precisamos avaliar a magnitude desse retorno em comparação à dose cavalar de travas ao nosso crescimento econômico que a política monetária em curso vem impondo.

            Por fim, acredito que perdemos a grande oportunidade de ter aparelhado nosso setor produtivo, principalmente com infra-estrutura, para, de uma vez por todas, conciliar crescimento econômico e inflação segura nesse país. Agora será preciso esperar por um novo ciclo de oportunidades.

Artigo anteriorFreio na economia
Próximo artigoJoelmir Beting critica governo Lula