O Globo
Mais cedo, convocação do ministro do Desenvolvimento foi barrada no Senado
BRASÍLIA e PORTO ALEGRE – A presidente da República, Dilma Rousseff, não vê necessidade de que o Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel esclareça ao Congresso Nacional as suspeitas de tráfico de influência que podem envolver consultorias prestadas por ele através da empresa P-21 Consultoria e Projetos Ltda.
– O governo acha estranho que o ministro preste satisfações no Congresso da sua vida privada, da vida pessoal passada dele – defendeu Dilma em Porto Alegre, nesta terça-feira, quando questionada por jornalistas.
Foi a primeira vez que a presidente se manifestou sobre o tema, mas sua avaliação repetiu o discurso de parlamentares governistas e da ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvati, de que os serviços prestados por Fernando Pimentel através de sua empresa P-21 Consultoria e Projetos Ltda foram feitos durante um período em que não ocupava cargos públicos.
– Sobre assuntos do governo é (seria) obrigado a ir – emendou a chefe do Executivo nacional.
Mais cedo, a Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) do Senado derrubou o requerimento do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) que pedia a convocação do ministro Fernando Pimentel. Na semana passada também foi rejeitado o pedido do PSDB para que ele esclarecesse os negócios diante da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.
– Se ele achar que deve ir, ele pode ir. Se ele achar que não deve ir,ele não vai – resumiu a presidente.
– O governo não acha nada – completou.
Dilma tampouco quis comentar quais os nomes estão em sua lista para assumir o ministério do Trabalho, vago desde a queda de Carlos Lupi,que deixou a pasta por suspeita de desviar recursos da pasta através de convênios com ONGs.
– Vocês aguardem, pode todo mundo aguardar. Não tem problema – desviou ao ser perguntada quem assumiria oposto ocupado interinamente pelo ex-secretário-executivo do ministério, Paulo Roberto Pinto.
Convocação é barrada com coordenação do Planalto
A estratégia de derrubada da convocação no Senado foi comandada pelo Planalto, e o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), encaminhou voto contrário. Mesmo assim, dois senadores da base, Ivo Cassol (PP-RO) e Pedro Taques (PDT-MT), votaram com a oposição pedindo esclarecimentos do ministro sobre os serviços de consultoria prestados por ele entre 2009 e 2010.
Na sua argumentação, o senador Alvaro Dias, líder do PSDB, afirmou que havia um acordo implícito com o governo de que todos os ministros denunciados deveriam dar explicações.
– Não comparecendo, nós podemos supor que as denúncias são tão graves que fica a impressão de que o ministro Pimentel está assumindo a culpa.
Pelo PT, o senador Jorge Viana (AC) rebateu a argumentação do tucano. O petista disse que o ministro já deu explicações à Comissão de Ética Pública, que nenhuma dúvida ficou sem ser respondida e que, diferentemente de outros casos, era um assunto da esfera privada do ministro.
– Vi isso no governo Fernando Henrique Cardoso. Vários ministros saíram do governo para trabalhar na iniciativa privada e depois alguns voltaram para a vida pública. Isso não é crime. Seria um equívoco fazer a fiscalização e controle de indivíduos que exerceram atividade privada. Não é justo, por conta de uma denúncia já esclarecida, que a pessoa receba a pecha de corrupto.
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) rebateu Viana.
– Não queremos colar nele a pecha de corrupto. Queremos esclarecimentos – disse, acrescentando:
– O Planalto tem usado dois pesos e duas medidas. Para todos que não são do PT, vêm ao Congresso.
Ele citou os nomes de todos os ministros não petistas que foram ao Congresso prestar esclarecimentos e arrematou.
– Agora o que vêm aqui são petistas para barrar o depoimento do ministro do partido.
Aloysio Nunes Ferreira chegou a citar a Velhinha de Taubaté, personagem do escritor Luís Fernando Veríssimo, que a definiu como a “última pessoa no Brasil que ainda acreditava no governo”.
– Nem a Velhinha de Taubaté se convenceu das explicações. Ele tem que apresentar os resultados da consultoria. Não vá me dizer que ele foi para uma bate-papo para ganhar R$ 1 milhão. Esse valor recebido deve ter tido resultado.
Já o senador Ivo Cassol causou desconforto dentro da base aliada ao defender a ida de Pimentel. Ele pregou um tratamento igual para todos os ministros e lembrou que Mário Negromonte, também filiado ao PP, teve que ir ao Congresso. Sobre Negromonte, pesam suspeitas de irregularidades no comando do Ministério das Cidades.
– Se o ministro tem medo de vir a uma comissão para se explicar, fica difícil ser ministro do Brasil.
O senador Pedro Taques também pediu a convocação:
– Quem não deve não teme. Qual o prejuízo de o ministro vir aqui e conversar com os senadores?
Ele também lembrou que é necessário dar esclarecimentos públicos, uma vez que a consultoria foi para a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), entidade que recebe recursos do imposto sindical.
Jucá foi rápido, evitou fazer uma grande defesa e, ao encaminhar voto contrário, disse que o episódio é uma questão privada. Como Pimentel não era servidor público na época, argumentou Jucá, não cabe dar esclarecimentos sobre sua vida privada no Senado.
Ao final da votação, o líder do PT, senador Humberto Costa (PE), questionado sobre se havia uma operação de blindagem, rebateu:
– Não há nenhuma blindagem. O que há é que, nesse caso específico, do Pimentel, não houve relação nenhuma com o governo. Talvez esse seja um episódio para prestar esclarecimentos para a Câmara de Vereadores de Belo Horizonte.
Sem conseguir ouvir Pimentel no Senado, a oposição protocolou um requerimento na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Câmara convidando Otílio Prado – sócio dele na empresa de consultoria P-21 – para prestar esclarecimentos. No mesmo requerimento de convite, o PSDB quer ouvir representantes da ETA Bebidas do Nordeste Ltda sobre as dúvidas que rondam o contrato feito pela empresa pernambucana com a P-21. O requerimento é assinado pelo líder do partido na Câmara, Duarte Nogueira (SP), e pelo deputado Bruno Araújo (PE).
– Essa é mais uma tentativa de tentarmos esclarecer a natureza precisa dos serviços prestados pela empresa de consultoria do ministro. Por isso estamos propondo este convite ao ex-sócio do ministro e aos representantes da empresa que teria atendido – disse Duarte Nogueira.
O partido também protocolou um requerimento de informação ao ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a respeito de escutas da Polícia Federal reveladas pela revista “Veja” no fim de semana. As gravações mostram a participação de parlamentares petistas na elaboração da “Lista de Furnas”, um dossiê falso que mostrava doações irregulares para a campanha de tucanos.
Dilma não fará campanha em municípios onde a base dispute
No Rio Grande do Sul, a presidente da República ainda salientou que sua postura nas eleições municipais de 2012 deverá ser de neutralidade, pelo menos nas cidades onde mais de um partido de sustentação do governo lançar candidaturas.
– Eu pretendo, ou estou cada vez mais inclinada, a não participar de eleições quando a minha base estiver envolvida – revelou.
– Eu tenho de ter responsabilidade com o país. Eu posso até ter(candidato) aqui dentro (no coração). Mas aqui dentro é uma coisa e, como presidenta, não tenho – asseverou.
Com isso, Dilma segue mais uma vez o modelo que seu antecessor Lula implementou durante seus oito anos de gestão. A presidente inclusive comentou sobre o estado de saúde de seu padrinho político, que concluiu recentemente a primeira parte do tratamento de um câncer na laringe.
– Falei com ele ontem (segunda-feira) e ele estava muito feliz porque ninguém esperava que fosse tão bom o resultado (da avaliação sobre a resposta do organismo de Lula à medicação) – comemorou.
Lembrando que ela mesma se curou de um linfoma, a presidente sublinhou que tanto a sua recuperação como a de Lula é uma mensagem para as pessoas que sofrem males semelhantes.
– É que esta doença é derrotável, cada vez mais você pode superar – concluiu.